Barthes, Em que consiste o Ditirambo?

Vem em todos os manuais sobre o Teatro Grego. A Tragédia nasceu em finais do século VI a.C. de um canto lírico-coral chamado Ditirambo (manifestação em honra do deus Dioniso), quando Téspis se destaca do coro dando lugar a uma forma dramática. Interessa pois perceber em que consiste o Ditirambo. 


«[...] Na época clássica, o espectáculo grego compreende quatro géneros principais: o ditirambo, o drama satírico, a tragédia, a comédia. Podemos acrescentar-lhe: o cortejo que antecedia a festa,o comos, provável sobrevivente das procissões (ou mais exactamente dos monómios dionisíacos); e embora se trate mais de concertos do que de representações, as audições timélicas, espécie de oratórios cujos executantes tomavam lugar na orquestra, à volta da tímele [altar sagrado], ou lugar consagrado a Dioniso.
O ditirambo é proveniente de certos episódios do culto de Dioniso, no século VII a.C., provavelmente perto de Coríntia, cidade comercial e cosmopolita. Rapidamente adquiriu duas formas: uma forma literária, e uma forma popular na qual o texto era (largamente) improvisado. Levado para Atenas por Téspis, o ditirambo normalizou-se. O desenvolvimento do género dramático (tragédia e comédia) não lhe fez nenhuma concorrência: as representações ditirâmbicas ocupavam os dois primeiros dias das Grandes Dionísias, antes dos dias consagrados aos concursos de tragédia e de comédia. Era uma espécie de drama lírico, cujos temas, mitológicos ou por vezes históricos, faziam lembrar muito os da tragédia. A diferença (capital) era que o ditirambo se representava sem actores (mesmo se havia solos) e sobretudo sem máscaras e sem trajos. O coro era numeroso: cinquenta executantes, crianças (de menos de dezoito anos) ou homens. Era um coro cíclico, quer dizer que as danças do coro se faziam na orquestra à volta da tímele, e não de frente, perante o público, como na tragédia. A música utilizava sobretudo modos orientais, era de significação tumultuosa (por oposição ao peã  [hino sacro] apolíneo); esta música tornou-se cada vez mais importante do que o texto, o que aproxima também o ditirambo da nossa ópera. Não nos resta nenhum destes ditirambos, salvo alguns fragmentos mutilados de Píndaro. [...]»



Fonte: Barthes, Roland. (2009) O óbvio e o obtuso. Lisboa: Edições 70.