Nathalie Sarraute, Nouveau Théâtre

O Nouveau Roman surge como resposta a uma nova concepção do homem, já não como essência que se concretiza mas como permanente construção, existência. Mas, a par de um Nouveau Roman poder-se-á também falar de um Nouveau Théâtre? Sim, na medida em que à preocupação de expôr uma situação através da intersubjectividade, se pretende a descrição, tão objectiva quanto possível, da interioridade, convidando permanentemente o leitor/espectador à co-autoria de forma a completar o que fica por dizer por se tratar do domínio do indizível.
Nathalie Sarraute [1902-1999] vai descrever nos seus romances a vida interior; mais interessada nas situações do que nas personagens observa o que apelidou de tropismos, os movimentos que a palavra lançada, ou mesmo a expressão de um silêncio, provoca no ouvinte. Se, aparentemente, a transposição deste universo íntimo lhe pareceu impossível de realizar no teatro, Sarraute acabou por aventurar-se, começando pelo teatro radiofónico. 


«[...] Nathalie Sarraute  faz-nos ver o mundo da inautenticidade: faz-no-lo ver por toda a parte. E por trás desse muro? Que há? Precisamente nada. Esforços vagos para fugir a qualquer coisa que se adivinha na sombra. A Autenticidade, verdadeira relação com os outros, connosco, com a morte, é sugerida por toda a parte, mas invisível. Pressentimo-la porque lhe fugimos. [...] Há a fuga para os objectos que reflectem pacificamente o universal e a permanência, a fuga para as ocupações quotidianas, a fuga para o mesquinho. [...]
Sobre o "Le Planetarium" de Nathalie Sarraute, Michel Butor escreve: "Onde quer que estejamos, e com quem quer que seja, mentimos na nossa conversação, começamos a lamentar palavras mal as acabamos de pronunciar: não era isso que eu queria dizer, a verdade não era isso, devia ter... Assim todas as palavras que pronunciamos encontram-se rodeadas, comandadas ou contrariadas, ampliadas ou atenuadas por todo um enxame de palavras que não pronunciamos. Estas palavras têm uma ressonância em nós que se prolonga, e que talvez as vá fazer emergir alguns dias depois numa narrativa; é como uma pedra que cai na superfície de um tanque e que provoca ondas que vão até aos bordos. Mas atenção, esta frase que acabamos de dizer, e será quase sempre necessário precisá-lo, esta frase que acaba de nos escapar não é somente seguida de repercussões, de remoinhos próximos ou longínquos, é também precedida de preparativos e esperas." [...]»


Fonte: Margarido, A. & Portela Filho, A. (1962) O Novo Romance. Lisboa: Editorial Presença.