O compositor alemão Richard Wagner (1813-1883) redigiu vários textos importantes para a reflexão sobre a obra de arte, nomeadamente este "A Arte e a Revolução" de 1849; aqui defende o fim da separação das diferentes linguagens artísticas (poesia, música, escultura, arquitectura), à semelhança do que acontecia na Tragédia Antiga (o drama como «a mais elevada obra de arte que é possível conceber»), e o livre acesso à cultura por parte de toda a comunidade, opondo-se ao elitismo e à desigualdade reinante. Contra a mercantilização da arte, Wagner vê a necessidade de uma Revolução que tome o homem como ser livre e criativo. O objectivo, quer da Revolução quer da Arte, é o «homem forte e belo».
«[...] Confrontemos agora nos seus traços mais importantes a arte que publicamente se pratica na Europa moderna e a arte pública dos Gregos, para podermos pôr a nu a diferença característica que as separa.
A arte pública dos Gregos que atingiu o apogeu na tragédia era expressão do que havia de mais profundo e mais nobre na consciência popular. O que há de mais profundo e de mais nobre na consciência laica contemporânea é a pura contradição, a negatividade que atravessa a nossa arte. [...]

Se o artista grego era recompensado antes de mais pelo seu próprio prazer na obra de arte e depois pelo sucesso e pela aprovação públicos, o artista moderno está amarrado a um contrato e a um salário. Estamos então em condições de caracterizar com rigor a diferença essencial: a arte pública dos Gregos era de facto arte, ao passo que a nossa é salariato artístico. [...]
Com a posterior decadência da tragédia a arte foi perdendo cada vez mais a sua qualidade de expressão da consciência pública. O drama desmembrou-se nas respectivas partes constitutivas; a retórica, a escultura, a pintura ou a música abandonaram o bailado unitário em que se moviam até então para seguirem cada uma o seu próprio caminho e se desenvolverem por conta própria, sujeitas a uma solidão necessariamente egoísta. [...]
A obra de arte perfeita, a expressão grandiosa e una de uma sociedade livre e bela, o drama, a tragédia, não renasceu - por maiores que tenham sido alguns dos tragediógrafos entretanto aparecidos - pela simples razão de que não pode renascer e, pelo contrário, tem que voltar a nascer por inteiro. [...]»
Fonte: Wagner, R. (2000) A Arte e a Revolução. Lisboa: Edições Antígona.